quarta-feira, 11 de maio de 2011

OBSERVAÇÃO: O presente artigo está em inglês. Caso algum colega tenha dúvida e queira o artigo com o texto na íntegra, favor encaminhar o pedido no campo comentários. Grato, boa leitura.

Peritonite biliosa associada com síndrome dilatação-volvulo gástrica em um cão.
Relato de caso:
Um cão da raça pastor alemão, macho, castrado , 5 anos de idade, foi encaminhado  a faculdade de veterinária de Ontario para avaliação de fibrilação atrial.
O paciente estava com episódios de vômitos há 12 horas, letargia e taquiarritmia. Há 7 dias, foi submetido a uma cirurgia de correção de dilatação e torção gástrica, acompanhada de gastropexia, apresentando uma melhora do quadro inicial sem maiores problemas.
No momento da avaliação, o animal apresentava-se quieto, ofegante e aproximadamente 8% desidratado. O exame físico revelou febre (40.1ºC), mucosas pálidas e taquicardia (>150 bpm) com ritmo irregular e pulso femoral forte porém errático. A palpação abdominal revelou uma forte sensibilidade dolorosa na porção cranial.
O eletrocardiograma confirmou a fibrilação atrial e as alterações laboratoriais foram: neutrofilia (21x10⁹/L  valor de referência 2,6 a 10,6x10⁹/L), com desvio a esquerda (1,7x10⁹/L bastonetes – valor de referência 0 a 0,3x10⁹/L), ALT em 1008 U/L (referência de 10 a 118U/L), fosfatase alcalina em 356U/L (referência de 20 a 150U/L), uréia em 11,4mmol/L (ref de 2.5 a 8.9mmol/L) e creatinina em 176µmol/L (ref de 27 a 124µmol/L). O tempo de coagulação estava <60 segundos (ref 90 a 120 seg).
Por radiografias torácicas ficou evidente a microcardia devida à hipovolemia, radiografias abdominais foram incapazes de mostrar o detalhamento das estruturas na porção cranial, alças intestinais com distensão gasosa significativa e ar livre no espaço peritoneal.
Ecocardiograma revelou pouco preenchimento ventricular, provavelmente secundário à taquicardia. Procainamida, lidocaína e dilitazem não tiveram sucesso em converter a fibrilação atrial em ritmo sinusal.
Abdominocentese recuperou um líquido rico em neutrófilos degenerados com bactérias intracelulares. O diagnóstico presuntivo de torção mesentérica parcial ou perfuração gastrointestinal com peritonite séptica foi levantado e o paciente submetido à laparotomia exploratória.
No transoperatório, aproximadamente 8 litros de líquido com odor fétido, amarronzado e floculento foram removidos da cavidade peritoneal, revelando superfícies serosas severamente inflamadas e coradas de bile. O local da gastropexia estava íntegro e havia aderência do omento na vesícula biliar. A parede da vesícula biliar estava fina, cinza e desvitalizada, com uma perfuração de 0,5cm em seu ápice. O ducto biliar comum foi cateterizado na altura da papila duodenal maior para confirmar a sua patência, antes de se realizar uma colecistectomia. Material do lúmen da vesícula biliar e da cavidade abdominal foi coletado por swab, para isolamento bacteriano e antibiograma.
Foi realizada lavagem completa da cavidade abdominal e drenos foram colocados para que se realizassem lavagens durante o pós operatório. O cão recuperou-se da anestesia sem maiores problemas, mas ainda apresentava taquicardia (>280bpm) com fibrilação atrial. A terapia pós operatória incluiu dilitazem, norepinefrina para manter a pressão arterial acima de 60mmHg, oxigênio intranasal, albumina e plasma sanguíneo para manter os níveis de proteína e suplementar os fatores de coagulação.  Antibioticoterapia com cefoxitin, morfina quando necessário e ranitidina.
Na histopatologia foi notada edema, fibrina, infiltrado de neutrófilos no ápice da vesícula biliar, hiperplasia epitelial e moderada inflamação linfocítica-plasmocítica. Os achados foram consistentes com infarto venoso agudo do ápice da vesícula biliar, com prévia colecistite de duração de aproximadamente 3 semanas.  
Quatro dias depois da colecistectomia, o paciente ficou abatido e houve um aumento na quantidade e viscosidade do líquido drenado do abdômen.  A cultura do material coletado durante a cirurgia revelou Enterococcus.sp que era altamente resistente à cefoxitina, porém sensível à vancomicina.
O antibiótico foi alterado e uma segunda laparotomia foi realizada para eliminar aderências e lavar novamente a cavidade abdominal.
Três dias após a segunda laparotomia, nova citologia do líquido abdominal foi realizada mostrando uma peritonite em fase de resolução e nova cultura bacteriana revelou pouca quantidade de Enterococcus.sp sensíveis ao cloranfenicol. Quatros dias depois, devido a pouca quantidade de secreção abdominal, o paciente teve os drenos removidos e liberado para casa com cloranfenicol via oral após 14 dias de internação.
No momento de retirar as suturas da cirurgia, o paciente estava vivaz e alerta. Oito semanas após a cirurgia, o paciente estava de volta à vida normal.
Ruptura de vesícula biliar é incomum em cães e rara em gatos. A causa mais comum de ruptura é a colecistite necrosante. Outras causas incluem obstrução crônica causada por colelitíase, neoplasia ou trauma.
A taxa de mortalidade de cães com peritonite biliosa varia de 39 a 50%. O suporte do tratamento para peritonite biliosa inclui a correção do vazamento de bile, lavagem da cavidade abdominal com drenagem contínua no pós operatório e terapia antibiótica.
O autor publicou este relato de caso por ser uma associação (colecistite necrosante e síndrome dilatação-torção gástrica) não muito citada na literatura veterinária.
Há a hipótese de que a isquemia da vesícula biliar possa ocorrer por dano ao ligamento gastrohepático durante  gastrectomia e neuropraxia vagal (paralisia do nervo vago).  No mais, cirurgia gástrica pode resultar em motilidade anormal da bile levando a estase biliar, colecistite e comprometimento da mucosa.  A translocação bacteriana consequente ao jejum pós operatório prolongado, podem potencializar a colestase a necrose da mucosa da vesícula biliar.
Canadian Veterinary Journal Volume 46, March 2005

4 comentários:

  1. Alguns erros de português foram achados, estão corrigidos. Se mais alguém achar, por favor comunique. Grato.

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  2. Muito interessante. Tanto os veterinários foram incansáveis , como o proprietário muito colaborativo. Na nossa realidade, apo´s 72 horas de internação, os proprietários solicitam eutanásia...infelizmente.

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  3. Nem imagino em quanto ficou essa "pequena"conta...Apesar de todos os procedimentos terem sido realizados em faculdade, ainda fica salgado no bolso. Ainda mais por que não se espera um gasto dessa magnitude de um dia para o outro. Muita sorte deste paciente, contou com uma equipe em prontidão com plasma, albumina, antibiograma ( o atb teve que ser mudado 2x), suporte medicamentoso para a fibrilação atrial...enfim, difícil de ser ver. Obrigado pelo comentário, aliás, anônimo quem?????

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  4. Muito interessante! Tem como me encaminhar o artigo original? Para cristiane.athayde@bol.com.br
    obrigada!

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